quinta-feira, 23 de março de 2023

No estragar é que está o ganho

Quando era criança e ia a casa de uma prima, ficava admirada por ela ter imensos brinquedos super fixes, mas todos em cima de um armário super alto, quase até ao tecto, com os quais ela não podia brincar. Ela via os brinquedos mas não usufruía deles. De vez em quando, e com a desculpa de eu estar lá com ela, conseguia convencer a mãe a dar-nos uma boneca por umas horas. Mas sempre com a promessa de não estragar.

Há uns anos, lembro-me de uma conversa que tive com colegas do trabalho, que me diziam que tinham uma máquina de lavar a roupa de 1000 rotações, mas que só a usavam nas 800, para não estragar. Eu, muito admirada, disse que tinha uma de 1200 e que usava sempre nas 1200, obvs. De outra forma, por que teria comprado uma de 1200 se não ia usar as rotações todas? Mas elas insistiam que eu devia usar a 1000 só, para não estragar.

Haverá muitas mais histórias destas, mas estes dois exemplos servem para demonstrar a minha indignação com as pessoas que têm coisas e não usam para não estragar. Vão usar quando? Quando morrerem? Às vezes penso se não sou demasiado descuidada com as minhas coisas, mas depois lembro-me destas histórias e quero só usar, usar, usar. Se estragar paciência, arranjo outras. Não me quero limitar por uma crença de algo que pode até nunca acontecer. Não quero ter coisas guardadas para não estragar e não poder usufruir delas. Isso parece-me tão parvo. Agora imaginem o que acharia a minha prima, criança, a ver os bonecos lá em cima do armário e sem poder tocar-lhes. Que absurdo.

4 comentários:

Anónimo disse...

Agora eu acho que tens razão, que devemos aproveitar o que temos enquanto podemos, mas durante muito tempo fui (e ainda sou um bocadinho) como as tuas colegas. Acontecia-me muito com coisas mais caras (no sentido literal e emocional), com os sapatos, por exemplo. Os mais bonitos eu guardava para "ocasiões expeciais" (lol, este conceito também tem muito que se lhe diga) para os poupar. Com brinquedos não, porque eu nunca tive muitos (as brincadeiras de infância eram mais na rua).
Acho que muitas vezes é coisa de pobri =D Isto é, muitas vezes tem que ver com o contexto familiar e cultural e é difícil de contornar, penso, por ex., naqueles emigrantes que eram miseráveis e que no estrangeiro conseguiram uma vida confortável que lhes permitiu comprar bens que antes não eram acessíveis, com que sempre sonharam e que gostam de mimar e exibir, lá está, em ocasiões especiais.
Posto isto, com a idade e algumas maleitas passou a fazer mais sentido usufruir das coisas e, no geral, não deixar (muito) para amanhã o que se pode fazer hoje.

Anónimo disse...

Sou eu: M.

Anónimo disse...

*ocasiões especiais

Maat disse...

olá e desculpa pelo atraso. mas amanhã já me vou desculpar mais :)

eu entendo o que dizes e eu também nunca fui assim. não ao ponto de ter sido privada de brinquedos que nunca mais iam ser usados, felizmente, mas também nessa mentalidade de guardar as coisas melhores. os meus pais são assim e ensinaram-me assim. talvez também por sermos pobres:)
mas comecei a questionar mas guardar para depois, para quando? sei lá se 'depois' vou estar cá ou se vou poder usar ou se vou ter as coisas ainda. sei lá se aquele vestido giro me vai servir depois, se não vou engordar 5 kg e já não o consigo enfiar. então agora penso sempre nisso e aproveito no momento. mas eu entendo isso que dizes e também foi preciso eu educar-me, de certa forma.